Sempre que lance Armstrong corria o Tour de France e aparece novamente nos noticiários, boa parte da mídia especializada de triathlon e ciclismo despeja vários comentários sobre a cadência mais elevada de Armstrong no ciclismo em relação a outros atletas. Infelizmente, nada pode comprometer mais a capacidade de um triatleta mediano desenvolver seu ciclismo do que acreditar que a manutenção de uma cadência muito alta melhora sua performance, independente do nível de condicionamento desse atleta. Não só os ciclistas profissionais competem em um nível de potência bem acima da média dos atletas amadores, mas também não precisam correr após o pedal, o que os permite levar suas pernas bem perto da exaustão no final de uma competição de ciclismo.

Para melhor compreender a importância da cadência e do esforço no ciclismo dentro do triathlon, primeiro você precisa compreender como sua cadência se relaciona com a prova de triathlon como um todo e como mudanças na cadência impactam seu corpo enquanto você treina ou compete.

A maneira mais fácil de visualizar a cadência e seus efeitos em seu corpo é ver a etapa de ciclismo do triathlon como um volume de “trabalho“ que precisa ser feito, como mover uma grande pedra de seu jardim do ponto A até o B o mais rápido possível. Você pode tentar mover a pedra em uma única e exaustante tentativa, o que seria equivalente a tentar completar o ciclismo com uma única pedala, usando uma coroa de pedivela enorme, como a que John Howard usou para quebrar o recorde de velocidade em terra de uma bicicleta. Esse tipo de esforço, seja movendo a pedra ou pedalando, irá gerar muita demanda muscular, deixando-o exausto quando você chegar ao ponto B.

Sua outra opção é quebrar a pedra enorme em vários pequenos pedregulhos e levá-los do ponto A ao B. Esse parece ser um caminho certo, ao menos que você quebre a pedra em tantos pedaços que você perderia muito tempo indo e voltando, além de aumentar sua frequência cardíaca. A medida que você corre para mover todas essas pedras, seu estressar corporal aumenta. Isso seria o equivalente a pedalar utilizando uma cadência muito alta de um ponto A até o ponto B.

A estratégia ideal está em um ponto intermediário, que é dividir o trabalho a ser realizado em pedaços menos gerenciáveis, de modo que você possa fazer o máximo possível cada viagem e em menos tempo possível. Em outras palavras, a cadência adequada para o ciclismo equilibra a carga aeróbica presente nas cadências mais altas e a carga muscular, presente nas cadências mais baixas.

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Para compreender melhor essa idéia, você pode entender a contração que seus músculos da perna fazem a cada pedalada como um bloqueio momentâneo do fluxo de sangue para dentro e para fora do músculo. Uma contração rápida (alta cadência) permite que o sangue entre e saia do músculo mais frequentemente, o que fornece nutrientes e oxigênio para o músculo e transporta os resíduos e o dióxido de carbono para fora dos músculos mais rapidamente. Essa opção, porém, exige um esforço maior de seu sistema aeróbico e de seu sistemas nervoso. As contrações rápidas forçam o coração a trabalhar mais e mais rápido, além de”fritarem” os nervos com mais frequência. Em contradição, uma contração longa (baixa cadência) bloqueia o transporte de oxigênio e nutrientes para o músculo, além de deixar os resíduos mais tempo no músculo. Essa é a sensação de “queimação” que você sente quando pedala com uma cadência muito baixa e muita contração muscular. Contudo, seu sistema aeróbico e nervoso sofre pouca pressão.

A cadência adequada equilibra esses esforços de forma que você possa aplicar a maior quantidade de força pelo maior tempo possível. Mas ao contrário do que você possa estar pensando, “gerenciável” no contexto acima não significa “de acordo com meu condicionamento”. Gerenciável é relativo a quanta potência você consegue produzir na bike, que depende não só do condicionamento, mas também de sua força específica para o ciclismo nas pernas.

Em outras palavras, não se compare aos ciclistas profissionais e ao que eles fazem, ao invés disso, veja o que você consegue fazer na bike. Quanto mais forte você é, mais fortes as contrações na bike. Quanto mais condicionado você está, mais tempo você conseguirá manter essas contrações. E quanto mais sustentável é sua força nas contrações, mais você precisa aumentar sua cadência e “quebrar o esforço em partes menores”.

No entanto, há mais uma peça no quebra-cabeça. Diferentemente dos ciclistas, nós triatletas precisamos considerar em nossa abordagem do ciclismo o que vem depois (a corrida) e ter em mente que o objetivo não é fazer o melhor tempo na bike, mas o melhor tempo total. O que você faz no ciclismo em um triathlon também precisa ser considerado dentro do contexto de suas necessidades na corrida.

A realidade de nosso esporte é que sempre estamos correndo com pernas cansadas. Isso significa que correr com uma passada forte e longa no Triatlhon vai rapidamente levar à frustração porque suas pernas cansadas vão ter muito menos para dar após o ciclismo que você acabou de fazer.

Se você entender que a corrida é o produto do tamanho vezes a frequência da passada, a maneira mais eficiente de se fazer uma corrida rápida no triathlon é aumentar sua frequência de passadas (o que pode ser treinado), ao invés de ter uma contração forte nas passadas longas. O preço que seu corpo pagará por essas contrações rápidas é uma fadiga maior em suas fibras musculares de contração rápida.

Uma frequência de passada mais elevada também significa que seus nervos motores “queimam” mais frequentemente, gerando a fadiga mais rapidamente nesses nervos. Isso resulta em sinais nervosos mais fracos, que resulta em contrações musculares mais fracas. Mas há maneiras de amenizar essa fadiga. Pesquisas recentes indicam que a fadiga do sistema nervoso pode ser adiada reduzindo a frequência na qual seus nervos queimam. (Postactivation potentiation: Role in performance, British Journal of Sports Medicine: Volume 38(4) August 2004, pp 386-387).

O que isso tudo significa? Basicamente, você precisa pedalar de uma forma que reduza o estresse que você encontrará na corrida, mantendo os sistemas importantes para a corrida o mais inteiros possível. As contrações lentas de uma cadência mais baixa vão recrutar mais fibras musculares de contração lenta, o que poupa as fibras rápidas para a corrida. E, como uma cadência mais baixa queima seus nervos menos frequentemente, você reduzirá a fadiga do sistema nervoso. Isso permite que você tenha sinais fortes e inteiros na corrida, resultando em uma corrida com contrações musculares mais fortes do que você teria se pedalasse com cadências mais altas.

Da mesma forma, como as fibras de contração lenta não contraem de forma tão explosiva e, por definição não tão frequentemente, você reduz a carga sobre seu sistema aeróbico. Pedalando com uma intensidade aeróbica menos você também gasta menos glicogênio e pode preservar esse combustível muscular para a corrida. Sua frequência cardíaca mais baixa também poupará um pouco de sua capacidade de tolerância ao lactato para a corrida.

É tudo realmente tão direto assim? Bem, sim e não. Sim porque os triatletas precisam considerar o que foi dito acima e manter uma cadência entre 150-85 rotações por minuto (RPM). A maioria dos atletas amadores não possui o condicionamento aeróbico ou a força para gerar a potência necessária em uma cadência mais alta. Ao treinar em uma cadência mais baixa contra uma resistência mais alta, no entanto, você vai desenvolver rapidamente a forma na perna, enquanto diminui o stress em seu sistema aeróbico. O resultado disso na balança é que você sai de treinos mais catabólicos (que agridem o organismo e o corrompem) para treinos mais anabólicos (que ajudam a reconstituir o organismo).

Se você é novo no Triatlhon ou se você já está na abordagem da cadência alta há muito tempo, você está desperdiçando a oportunidade de treinar força e recrutar mais músculos. Tente pedalar algumas semanas com big gear (marcha mais pesada), mantendo sua velocidade enquanto reduz sua cadência para 80 RPM ou menos. Lembre-se que você está treinando para uma competição de triathlon, e seus esforços no treinamento devem considerar ter essa meta em mente. Simplesmente mudar sua pedalada para a menor cadência não vai gerar melhoras se você não está forçando os músculos a trabalhar mais ao mesmo tempo!

Ao mesmo tempo eu disso “não” acima porque há exceções à abordagem da baixa cadência à medida que suas habilidades no ciclismo melhoram. Da mesma forma, quanto menor a distância do triathlon que você vai correr, maior a potência que conseguirá gerar. Se você briga por pódios e sua categoria em provas de sprint triathlon ou triathlon olímpico, e em alguns casos até mesmo em provas de meio Ironman, você precisará aumentar a sua cadência e gerar mais potência.

Conjugando todas as variáveis, na ironguides nós usamos algumas táticas e ferramentas simples para melhorar as habilidades no ciclismo de um triatleta., com foco em provas de Triathlon. Um dos treinos que nossos atletas fazem regularmente é feito melhor em uma bicicleta de spinning ou no rolo de treinamento ou ainda contra o vento, situações nas quais pode produzir grande resistência na pedalada. Após um aquecimento, faça de 10 a 30 repetições do seguinte exercício:

> 60 segundos contra grande resistência seguido de 60 seguidos de resistência zero, bem leve para recuperação

Recomendamos uma cadência de 40 a 45 RPM para esse treino. A cadência deve ser tão baixa assim porque a resistência é tão alta que você não conseguiria aumentar seu giro. Por exemplo, um atleta da ironguides amador da faixa etária 40-45 anos faz 20 dessas repetições a 520 Watts de média; não é à toa que ele tem ganhado todas as provas de sprint neste ano e que frequentemente tem subido no pódio em outras distâncias.

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Você pode criar variações dessa abordagem pedalando com uma marcha bem pesada na estrada por intervalos maiores, buscando aquela sensação de pura contração muscular e se mantendo na posição aero o maior tempo que conseguir. Seus esforços constantes de pedalar forte contra uma resistência alta vão recrutar mais fibras musculares e desenvolver sua força na bike rapidamente. Com um programa de treinamento devidamente estruturado, seus treinos com esforços máximos e com alta resistência não sobrecarregarão seu sistema aeróbico, mas permitirão a construção da força muscular necessária no Triathlon.

É importante lembrar que “treinamento devidamente estruturado” não significa que você deva usar metas de potência para montar seu treino. O ideal é cada atleta realizar as seções de treino baseado no melhor esforço possível, de acordo com a percepção de cada um. Você pode usar suas leituras de potência ter um retorno de como você está se desenvolvendo ao longo do tempo ou para identificar fadiga e rastrear os pontos de melhoria. Mas é a estrutura de cada seção de treinamento que gera as mudanças psicológicas que buscamos, seja com esses intervalos curtos para desenvolver a forçam muscular, seja com contra-relógios no final de treinos longos para desenvolver resistência ao lactato.

Em resumo, se você quer melhorar seu tempo no Triathlon e não somente no ciclismo do Triathlon, você precisa adotar uma cadência mais baixa do que aqueles atletas que treinam somente para o ciclismo:

> Se você é um atleta amador mediano, evite abordagens usadas pelos ciclistas profissionais no ciclismo. Nós triatletas medianos não temos a combinação necessária de força muscular e capacidade aeróbica que esses atletas possuem para tornar a abordagem da alta cadência eficiente.

> Lembre-se de que sua cadência no ciclismo de um Triathlon deve levar em conta o que a corrida demandará do seu corpo. Uma cadência mais baixa para um mesmo nível de potência vai contribuir para poupar suas fibras de contração rápida, além de reduzir a fadiga sobre o sistema nervoso, ajudando-o a correr mais rápido.

> Como triatleta, você não pode pedalar até a exaustão! Usando uma marcha mais pesada e uma cadência menor você reduz sua frequência cardíaca e o gasto de glicogênio, abrindo espaço para correr mais tempo a níveis maiores de esforço.

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Alun Woodward, Coach ironguides

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